14/01/2016

Renda fixa pode ficar menos atraente em 2017

Em razão de outra tentativa do governo federal de aumentar suas receitas

Os investimentos podem ficar menos atraentes no próximo ano, em razão de outra tentativa do governo federal de aumentar suas receitas. Uma medida provisória que aguarda votação no Congresso, a 694, pretende alterar a tributação das aplicações financeiras hoje isentas de Imposto de Renda.

Analistas apontam, no entanto, que as mudanças podem prejudicar setores como construção e infraestrutura, hoje beneficiados por investimentos com incentivo fiscal.

Entre as alterações previstas na MP, está a tributação de letras de crédito rural (LCA) e imobiliário (LCI).
Sobre a LCI, cujo objetivo é elevar os recursos disponíveis para o financiamento imobiliário nos bancos, incidiria IR de 17,5% em aplicações até 360 dias. A partir daí a alíquota cairia gradativamente até alcançar 10% –para vencimento após 1.080 dias. Já na LCA, a alíquota seria fixada em 10%, independentemente do prazo e indexador.
André Leite, sócio da consultoria TAG Investimentos, afirma que a tributação das letras de crédito é boa, já que aumentaria a atratividade de aplicações como os CDBs (Certificados de Depósitos Bancários), sobre os quais já incide o IR.

Para João Carlos Gonçalves da Silva, diretor do banco Fator, no entanto, a tributação das LCI e LCA não condiz com a intenção do governo de retomar o crescimento do país pelo incentivo a setores como o da construção civil.
"A cobrança de IR na LCI encareceria, por exemplo, a tomada de crédito das construtoras, o que poderia reduzir o número de lançamentos", afirma.

TIRO NO PÉ
A venda de títulos de dívida de longo prazo para financiar a infraestrutura, conhecidos como debêntures incentivadas –que hoje têm incentivo fiscal–, também passaria a ser tributada.A tabela proposta também começa em 17,5% –para resgates até 360 dias– e cai gradativamente até alcançar o mínimo de 10%, se o dinheiro for sacado após 1.080 dias.

"Vai ser um tiro no pé da economia do país. As debêntures de infraestrutura caíram no gosto da pessoa física e são importantes para incentivar investimentos. Quando você tributa, vai tirar um atrativo para o investidor e matar um mercado que vinha muito bem", diz Leite, da TAG Investimentos.

Outras aplicações hoje isentas, como CRI e CRA (Certificados de Recebíveis Imobiliários e do Agronegócio), também estão incluídas na MP. Além disso, investimentos atrelados ao CDI (Certificado de Depósitos Interfinanceiros) ou à taxa básica Selic terão alíquota única de 22,5%.

Na renda variável, uma das principais mudanças propostas é a tributação do rendimento obtido em aplicações nos fundos imobiliários, com uma alíquota de 17,5%. Hoje, apenas o ganho de capital –obtido quando o investidor vende suas cotas por preço mais alto do que o pago por ele no momento da compra– é tributado, em 20%.
"A MP complica bem a estratégia de quem queria investimentos livres de impostos", avalia Leonardo Bortoloto, sócio-diretor da consultoria Aditus.

Habib Nascif Neto, CEO da gestora Órama, afirma que as mudanças vão confundir o investidor e dificultar a atuação das gestoras de recursos.
"A medida cria distorções e dificuldades de controle para as gestoras, que terão que administrar tributações diferentes dentro de um mesmo produto e talvez de um mesmo cliente", avalia.

Mudança na renda fixa forçaria aplicação por prazo maior
Além de aumentar a tributação em produtos de renda fixa, a medida provisória 694 deve forçar os investidores a permanecerem por mais tempo nos investimentos. Isso porque a alíquota de Imposto de Renda cai gradativamente quando aumentam os prazos das aplicações (veja os detalhes ao lado).

Para Andrea Bazzo Lauletta, sócia do escritório Mattos Filho, o objetivo é incentivar a poupança de longo prazo.
"O governo está forçando um alongamento compulsório de prazo. Mas como ele obriga alguém a isso se não há confiança no país hoje?", questiona André Leite, sócio da TAG Investimentos. "Isso não se faz com MP, e sim com políticas boas e consistentes para que o investidor se sinta mais confortável para alongar a aplicação."
A MP prevê ainda uma espécie de "punição" para quem aplicar em papéis indexados ao CDI ou à taxa básica de juros, a Selic. A tributação começaria em 25% e terminaria em 17,5%, a alíquota máxima cobrada em outras aplicações. Se o cliente resgatar antes do vencimento, pagará a alíquota de 25%.

A tabela seria a mesma para fundos de investimento de renda fixa –com exceção da alíquota maior em caso de saque antes do prazo.
Hoje, a maior parte de CDBs e LCIs é pós-fixada e tem como indexador o CDI. No Tesouro Direto, o título Tesouro Selic acompanha a variação da taxa básica. Esses papéis são os mais recomendados em um cenário de taxa de juros em alta, como o atual. Mas mantê-los na carteira poderá significar imposto mais salgado para o investidor, se a MP for aprovada.

"Isso cria insegurança tributária e jurídica. Se está mexendo nisso agora por causa de um problema orçamentário, o que garante que não vai mexer de novo?", questiona Leite. Para ele, há uma tentativa de gerenciar a dívida pública, tirando peso das aplicações indexadas e aumentando o peso de títulos prefixados e atrelados à inflação.

A tendência, se o texto for aprovado como está, é que aumentem as emissões prefixadas ou atreladas à inflação. E o investidor poderá pedir taxas mais elevadas nos títulos indexados a CDI e Selic para compensar a alíquota maior de IR. "A única coisa que não vejo é uma migração para a renda variável, pois os investidores continuarão querendo aproveitar taxa de juros elevada, comparativamente com os demais mercados", diz Leonardo Bortoloto, sócio da Aditus. 

(DANIELLE BRANT e ANDERSON FIGO - Folha de S.Paulo)
 

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