20/11/2015

ÚLTIMOS 12 MESES

Previdência privada ignora crise e tem captação positiva

É o montante depositado em fundos de previdência privada nos últimos 12 meses, um crescimento de 9,2%. O movimento é contrário ao de outras aplicações, como a poupança A crise que fez os brasileiros retirarem mais de R$ 57 bilhões da poupança no ano e não preservou sequer a "queridinha" renda fixa passa ao largo dos fundos de previdência privada. Esta aplicação, usada por quem deseja complementar a aposentadoria no futuro, captou R$ 39,4 bilhões nos últimos 12 meses, um salto de 9,2% em seu patrimônio líquido. De acordo com números da Superintendência de Seguros Privados (Susep), em setembro a carteira de investimentos desses fundos ultrapassou pela primeira vez meio trilhão de reais. Para especialistas, a previdência privada é favorecida pelo ocaso da poupança, pela disciplina de longo prazo que impõe aos poupadores, por vantagens tributárias e pela maior conscientização da população sobre a necessidade de planejamento financeiro. 

- A restrição na capacidade do brasileiro de poupar impactou uma série de segmentos, mas foi flagrante na poupança. Ela tem registrado mais saques do que depósitos por meses seguidos. Aqueles investidores mais atentos acabam migrando de aplicação ou simplesmente direcionando novos investimentos para outros veículos - explicou Diego Kashiwakura, analista sênior da Moody's Investors Service. - No caso da previdência privada, também influencia uma maior conscientização sobre economia de longo prazo na população. 

Apesar da isenção total de Imposto de Renda (IR), a poupança tem sofrido com os juros altos. Isso porque seu rendimento é fixo - de 6,17% ao ano mais Taxa Referencial (TR), contra uma inflação em 12 meses de 9,93% em outubro -, enquanto títulos que acompanham a taxa básica Selic rendem 14,25% ao ano, por exemplo. Além disso, com a alta do desemprego e do endividamento das famílias, os poupadores têm precisado sacar recursos da poupança para cumprir obrigações. 

Nesse contexto, a previdência está no final da fila dos recursos aos quais o aplicador recorre em momento de dificuldade, diz Fabiano Lima, diretor técnico de Vida e Previdência da SulAmérica. 

- Como exige uma contribuição mensal, geralmente da ordem de 5%a 6% da renda, a previdência privada é mais resiliente em tempo de crise. Ela condiciona o poupador a uma disciplina - observa. - O que pode acontecer é haver queda nos aportes, que são contribuições esporádicas. Mas isso não está acontecendo. 

TAXA MAIOR É DESVANTAGEM 

A resistência da previdência privada também está ligada à sua "juventude", ressalva Carlos Heitor Campani, professor de finanças da Coppead/UFRJ. Um dos dois planos hegemônicos, o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) - mais indicado para quem faz declaração simplificada de IR - foi criado há apenas 13 anos. 

- Os planos são novos, as pessoas ainda não se aposentaram para gerar uma retirada consistente das aplicações. Além disso, o modelo fiscal penaliza quem retirar o dinheiro cedo - explica. 

A alíquota de IR que incide sobre os fundos de previdência privada é regressiva. Para pagar a fatia mínima ao Leão, 10%, é preciso manter o fundo por pelo menos dez anos. Quem retira o dinheiro com menos de dois anos de aplicação paga, aliás, alíquota de 35% - muito superior à dos próprios fundos de investimento tradicionais, cuja alíquota para o mesmo período varia de 17,5% (entre 361 e 720 dias) a 22,5% (menos de 180 dias). 

- Eu só sacaria o dinheiro da previdência se algo muito grave acontecesse. Tenho previdência pensando no futuro, como um complemento de renda - afirma Luiz Wagner Santana, de 54 anos, que tem um plano há duas décadas e fez um para sua filha quando ela nasceu, há 14 anos. 

O presidente da Federação Nacional de Previdência e Vida (FenaPrevi), Osvaldo Nascimento, também credita o bom desempenho dos fundos de previdência a razões mais intangíveis, como transparência e liberdade de mudança. 

- Quem aplica em PGBL ou VGBL consegue acompanhar a rentabilidade diariamente, o que nem a poupança permite. Outro elemento é o direito de escolha: dentro desses dois tipos de fundos, pode-se escolher diversos perfis de carteira - explica. - A portabilidade é um diferencial. Se você quiser sair de um fundo de ações e ir para um renda fixa, precisará resgatar e aplicar de novo, pagando imposto. No caso da previdência, isso pode ser feito sem custo. 

A previdência privada, porém, tem algumas desvantagens frente a outros fundos e a títulos do Tesouro. A mais óbvia é a taxa de administração, que costuma ser maior que a de outras aplicações. Segundo Campani, um investidor que está começando do zero e deseja reservar entre R$ 500 e R$ 1 mil para um fundo de previdência pagará, em média, 2% ao ano de administração. Quem já começa com um capital relevante, como R$ 100 mil, tem acesso a taxas menores, de 0,8% a 1,5% ao mês. Segundo ele, fundos que não são de previdência cobram entre 0,6% e 1% ao ano. Além disso, muitos fundos de previdência cobram a chamada taxa de carregamento, que consome uma fatia do dinheiro antes mesmo de ele entrar no fundo. 

- É muito importante que essas taxas sejam negociadas. Hoje, a partir de R$ 100 mil, já é comum que os bancos não cobrem taxa de carregamento. Já a taxa de administração, a princípio, não é negociável. Só que, na prática, o banco tem vários fundos de previdência cuja única diferença é a taxa de administração. Então o cliente pode negociar em qual contrato entrará - diz o professor Campani . 

SE A CRISE CONTINUAR, FUNDOS PODEM SOFRER 

Campani acredita que, com o aumento da competição, a tendência é que as taxas dos fundos de previdência caiam ao nível das do restante da indústria. Ele observa, porém, que, mesmo com a desvantagem atual, a previdência permite acessar mercados diferentes, como fundos com alguma parcela de ativos no exterior. A possibilidade de ajustar a estratégia ao cenário econômico vem garantindo uma rentabilidade atraente na previdência privada, ressaltam Altair César de Jesus e Guilherme Rossi, superintendentes da Brasilprev, líder do mercado, controlada pelo Banco do Brasil. 

Apesar de sua resistência, a previdência não é imune à crise, pondera Lima, da SulAmérica: 

- Se o cenário macroeconômico continuar ruim, vai acabar chegando nela, que poderá até registrar captação negativa. Mas essa não é a expectativa.  (RENNAN SETTI - O Globo)

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