24/07/2020

Os caminhos da reconstrução

A pandemia de covid-19 impõe acelerar reformas que já eram necessárias antes dela.
A fim de subsidiar os gestores públicos na elaboração de políticas de recuperação do País após a pandemia, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) engajou pesquisadores de diversas disciplinas para analisar as melhores práticas internacionais e compilar uma série de mais de 30 propostas de curto a longo prazo. O documento Brasil Pós Covid-19 foi estruturado em quatro eixos: 1) Reconstrução das cadeias de produção; 2) Inserção internacional; 3) Investimentos em infraestrutura; e 4) Proteção de populações vulneráveis.

O primeiro eixo foca especialmente o suporte às micro e pequenas empresas, além da oferta de bens e serviços em setores estratégicos; eficiência da intervenção pública; e a preservação e geração de empregos. Dadas as exigências de dispêndio público em um cenário de restrição fiscal, seriam medidas temporárias, com validade de até cinco anos.

Em primeiro lugar, como uma espécie de balão de oxigênio, é indispensável flexibilizar os regimes de insolvência e concurso de credores. Junto a isso, é preciso promover a injeção de capital naquelas empresas, por exemplo, por meio de empréstimos sem juros, obviamente com a garantia de manutenção dos empregos, ou do uso estratégico de compras públicas. Particularmente importantes são os estímulos à saúde (indústria, pesquisa e serviços), por intermédio de garantias de crédito, subvenções e incentivos fiscais.

Dado o déficit crônico da poupança no Brasil e as restrições fiscais agravadas pela pandemia, a capacidade de investimentos dependerá fortemente dos investidores externos. Isso implica a aceleração da agenda de integração internacional, reforçando o compromisso do País com as regras do comércio internacional e o combate ao protecionismo. Novas parcerias internacionais são especialmente importantes para projetos de infraestrutura.

A infraestrutura, por sinal, seria a principal alavanca de uma recuperação sustentável, como aconteceu historicamente em grandes crises sistêmicas como a Depressão de 1929 ou a Recessão de 2008. A garantia da atratividade dos atuais contratos público-privados, assim como novas oportunidades para o capital privado, não só podem gerar empregos, como solucionar graves déficits sociais. Transporte e saneamento são particularmente estratégicos. A criação de uma câmara de revisão de concessões facilitaria negociações e garantiria o alinhamento à estratégia mais abrangente do governo federal. Além disso, seria preciso remover os entraves burocráticos que dificultam a participação do capital externo e criar condições favoráveis à expansão de novos projetos, como a ampliação do acesso à banda larga de qualidade.

As propostas voltadas para as populações de baixa renda levam em conta os mais afetados pela crise sanitária (idosos) e os mais afetados pela crise econômica (os jovens), assim como o aprimoramento dos dois alicerces da proteção social: saúde e educação. A curto prazo, isso implicaria a prorrogação dos programas de subsídio temporário à contratação de trabalhadores e dos mecanismos de redução de jornada. Essas medidas emergenciais seriam acompanhadas da unificação e ampliação dos benefícios voltados para famílias com crianças e de uma estratégia integrada para promover o emprego e a educação entre os jovens vulneráveis.

Prioridade absoluta, segundo o documento, é o fortalecimento do SUS, por meio de reformas constitucionais que garantam a ampliação e alocação de recursos e o acesso a novas fontes. Na educação, é preciso adaptar a rede pública às mudanças tecnológicas aceleradas com a pandemia, por exemplo, distribuindo tablets aos alunos e facilitando o acesso de suas famílias à internet. O Ipea propõe ainda a criação de um sistema de financiamento com pagamentos vinculados à renda futura para que os jovens de baixa renda possam se matricular em cursos técnicos e de ensino superior.

Como se vê, algumas dessas medidas são reativas, mas a maioria já era necessária antes da pandemia e só se tornou urgente com ela. O poder público precisa dar atenção a esse elenco de medidas para que os sacrifícios impostos pela guerra contra o vírus não sejam em vão.   

(Agência Estado)

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