Nunca é tarde para começar a investir
A principal diferença entre um jovem e um senhor investidor são os horizontes temporais e as prioridades. Procurar orientação, planejar as finanças e mudar alguns hábitos são comportamentos fundamentais para quem quer começar a investir
Para Daniel Bellangero, head de previdência da Easynvest e planejador financeiro certificado, uma pessoa que começou a investir mais velha deve esquecer a poupança
Com o objetivo de fazer uma espécie de fundo de reserva, a professora aposentada Márcia Lobo, prestes a completar 61 anos, decidiu investir em ações. Mas ao contrário de muitas pessoas que começam a poupar ou aplicar dinheiro desde cedo, com o objetivo de criar uma Previdência Privada, ela iniciou esse movimento há apenas dois anos. A professora é um exemplo de que nunca é tarde demais para começar a investir e pensar em um dinheiro extra.
“Minha geração não teve esse aprendizado, em escolas ou fora delas, sobretudo em relação às mulheres. Mas não existe idade limite para aprender, e eu, como educadora, sei muito bem disso. Além disso, é bom estar preparado, porque nunca sabemos o que pode acontecer amanhã”, comenta Márcia que, assim como a maioria dos brasileiros, foi pega de surpresa com a pandemia de covid-19.
O ponto de virada para a aposentada foi a participação em um workshop de investimentos para mulheres organizado pela corretora onde a filha trabalha. Na ocasião, ela aprendeu a organizar as entradas e saídas e a separar seus gastos em blocos, o que ajuda a visualizar de onde por vir o dinheiro para aplicação – reduzir as saídas para comer, por exemplo. A principal dica que Márcia dá àqueles que desejam começar a investir é: defina o que se pretende com essas ações.
“Você pode começar como eu comecei, com o Tesouro Direto, e não precisa colocar milhões. Começa com R$ 50, R$ 100, aos pouquinhos, economiza todo mês. O que é importante, nesse projeto, é colocar objetivos: o que você quer e o que você não quer?”, sugere ele.
Docente da Escola de Gestão e Negócios da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), a administradora Emanuelle Nava Smaniotto comenta que muitas pessoas associam o “poupar” com o ato de guardar dinheiro para render no longo prazo. Por isso, muitas pessoas podem achar que investir está limitado a um público mais jovem. A questão é que nunca é tarde para começar porque estamos sempre vivendo.
Pessoas mais velhas, por exemplo, podem pensar nas famosas caixinhas de investimento de uma maneira mais ligada ao presente, que envolva o curto e o médio prazo. Por que não poupar durante um ano para uma viagem? Por que não poupar durante três anos para trocar de carro? A principal diferença entre um jovem e um senhor investidor são os horizontes temporais e as prioridades.
“Além disso, convivemos diariamente com a inflação e nosso dinheiro perde valor ao longo do tempo. Sempre dou o exemplo do Kinder Ovo para meus alunos. Quando eu era criança, o Kinder Ovo custava R$ 1; hoje, custa R$ 7. Isso significa que eu estou ficando velha e que a inflação existe, pois os preços dos bens se alteram ano após ano. Se você não investir ou poupar, seu dinheiro irá perder valor, já que R$ 100 mil hoje podem muito bem ser R$ 95 mil amanhã e assim por diante! Ninguém quer perder dinheiro à toa, certo?”, afirma Emanuelle.
Perfil do investidor
Os especialistas dizem que o primeiro passo que deve ser tomado é procurar orientação, a não ser que o novo investidor já seja da área de economia ou negócios e, além disso, possua um nível interessante de conhecimento sobre o assunto. Caso contrário, é recomendado pedir indicações para amigos e familiares sobre corretoras e instituições financeiras, além de pesquisar a reputação dessas empresas. Hoje, esse tipo de pesquisa está a poucos cliques de distância.
Outra recomendação de ouro: desconfie de empresas que chegam oferecendo produtos e aplicações prontos. Isso porque antes de indicar investimentos é preciso conhecer, primeiro, o perfil de quem deseja aplicar, etapa obrigatória de acordo com normatizações do Sistema Financeiro Nacional.
O perfil de Márcia, por exemplo, foi considerado conservador, aquele que é mais avesso a riscos. Conforme ela foi “pegando gosto”, contudo, decidiu diversificar, uma vez que também gosta de novos desafios. Hoje, cerca de 70% de seus investimentos estão em títulos do Tesouro Direto, com vencimentos em 2022, 2023 e 2024, enquanto o restante está em ações da Magazine Luiza (MGLU3).
“Quando falamos em ‘perfil’, estamos nos referindo àquilo que o investidor busca com esse dinheiro. Trata-se de um recurso mensal para pagar contas? Deixar uma herança para a família? Depende muito disso. Se o foco for uma reserva que seja fácil de usar em um mês com algum imprevisto, ou para pagar uma conta de cartão que eventualmente venha mais alta, deve-se pensar em investir para formar uma reserva de emergência”, orienta Daniel Bellangero, head de previdência da Easynvest e planejador financeiro certificado.
A reserva de emergência é aquele recurso que tem liquidez, que está na sua conta amanhã se você precisar. São recursos atrelados à taxa de juros, o menor risco possível dentro das categorias de investimentos. Segundo Bellangero, quando ainda se está trabalhando, o cálculo ideal para esse fundo é que ele equivalha a, pelo menos, seis meses de salário.
“Se a pessoa já estiver aposentada, essa reserva pode ser até menor, porque teoricamente a Previdência Social é uma coisa que não será perdida, que vai perdurar até o fim da vida. Nesses casos, a reserva de emergência pode ser um pouco mais curta, talvez de quatro meses. E, assim que essa reservar estiver pronta, o investidor pode considerar buscar aplicações atreladas à inflação, em especial a de curto prazo, para que se possa garantir o poder de compra ao longo do tempo”, complementa.
O planejador acrescenta ainda que independentemente de quais sejam os objetivos dessa pessoa que começou a investir mais velha a primeira coisa que ela deve fazer é esquecer a poupança, dada a baixa rentabilidade. Em 2020, inclusive, a poupança perdeu para a inflação e teve sua pior rentabilidade em 18 anos.
Planeje-se e estude
Mas de nada adianta decidir investir se outros hábitos em relação às finanças também não forem modificados, em especial em relação ao planejamento. É fundamental registrar todas as entradas e saídas e categorizar os gastos por grupos, como Márcia Lobo aprendeu no workshop de investimentos para mulheres do qual participou.
Essa organização pode ser feita da forma que a pessoa achar melhor. Anotar em uma agenda diária, ter um caderno específico para isso, usar planilhas de Excel. O importante é controlar. Quanto mais simples, melhor, pois meios muito complexos de organização colaboram para se desista rapidamente, sem conseguir incorporar o hábito à rotina. Com isso, aos poucos, os gastos supérfluos vão sendo eliminados e/ou realocados.
E assim que começar a investir, também é interessante se aprofundar no mundo dos investimentos e das finanças. Orientação profissional é sempre indicada, mas nada impede que o mais novo investidor também amplie seus conhecimentos sobre a área.
“Atualmente, muitas informações sobre finanças estão disponíveis no mundo virtual! Podcasts e redes sociais podem ajudar bastante. Infelizmente, como em qualquer meio, existe muita ostentação e mentira. Então vale sempre se ligar e fazer uma filtragem básica sobre quais conteúdos seguir. Ainda, há muitos programas de educação financeira gratuitos, realizados por instituições de ensino, e cursos com valores acessíveis também. Recomendo procurar esses cursos e mentorias”, pontua Emanuelle Nava Smaniotto.
(Murilo Basso –E-Investidor)