19/04/2017

Jovens de hoje terão um novo cenário pela frente

No meio rural, as dúvidas são ainda maiores

Pegar o canudo e entrar no mercado de trabalho com carteira assinada ou por empreendimentos formais ou informais poderá ser uma tarefa ainda mais árdua para os jovens se aprovada a proposta do governo para a reforma da Previdência. No meio rural, as dúvidas são ainda maiores. Especialistas afirmam que o cenário não será dos melhores daqui pra frente. Nélson Marconi, professor da Escola de Economia da FGV-SP, vê basicamente três diferentes situações que poderão ocorrer em um Brasil no caminho aos anos 2060. Para quem entra hoje no mercado de trabalho aos 24 ou 25 anos de idade no regime de CLT ou com outro vínculo que garanta o recolhimento da aposentadoria de forma compulsória, para se aposentar pelo teto teria que trabalhar 49 anos.

Ou seja, aos 74 anos de idade, diz Marconi. Mas quando essa população chegar à idade para ter acesso ao benefício, o valor que irá receber não será suficiente para garantir uma aposentadoria tranquila. “Irá representar o equivalente a um mecanismo complementar de renda”, afirma. Para outras duas parcelas da população que estão entrando no mercado de trabalho neste momento em que se discute de uma reforma previdenciária, o cenário também não promete ser bonito nem fácil. Com uma economia que se torna cada vez mais informal e com leis como a da terceirização, o mercado de trabalho poderá ser bem diferente para os jovens que não terão vínculo empregatício frequente. Nos centros urbanos, onde está a maioria das oportunidades, Marconi vê trabalhadores com registros temporários em vários segmentos do comércio, como alimentação, limpeza e outros. “Esta parcela da população poderá ser grande. Certamente não irá contribuir o tempo todo com a Previdência pois terá vínculos temporários.

Como serão precisos 25 anos de contribuição, não irá conseguir se aposentar com 70 anos. Terá direito ao benefício de prestação continuada, com aumentos desvinculados do mínimo. Isto poderá gerar um aumento da pobreza no país”, afirma. Os trabalhadores rurais sofrerão as maiores consequências da reforma que está por vir, na opinião de Marconi. “Hoje este trabalhador não contribui ou, quando muito, de o faz de forma esporádica. Atualmente a previdência rural é um programa praticamente assistencial. Com a reforma, estes trabalhadores irão parar no quesito da renda mínima, que será desvinculado do salário mínimo. O que acontece é essas pessoas irão sair do sistema de previdência social. O Brasil vai estar mais pobre, infelizmente”. Jorge Fernando Valente de Pinho, professor da Universidade de Brasília, diz que a reforma traz soluções equivocadas para uma questão complexa. “Tratam a reforma como uma visão contábil”, afirma. Importante também, afirma ele, é que o déficit da Previdência, causado por apropriações do dinheiro pelo governo para outros fins (e ele dá como exemplo a construção de Brasília) poderá aumentar. “Como iremos fechar esta conta?” Pinho afirma que os recursos arrecadados com a Previdência são da sociedade, e não do governo.

A respeito dos jovens que entram hoje no mercado de trabalho, ele acredita que o desinteresse em recolher a previdência poderá aumentar. “A juventude pensa que, se não vai se aposentar ‘nunca’, então, por que pagar?”, questiona Pinho, professor de RH do departamento de administração da UnB. João Pedro Tuccori Pupo, 29 anos, professor de japonês e português para estrangeiros, é um exemplo do que se pergunta o professor Pinho. “Se for mesmo assim, não vejo o menor sentido em recolher um dinheiro para aposentadoria”, diz Pupo. Formado em Letras, Pupo trabalhou em livrarias, período em que contribuiu compulsoriamente. Mas foram trabalhos com carteira assinada entre períodos de trabalho informal, o que significa que contribuiu de forma inconstante. “Teria que recolher desde os 18 para me aposentar aos 65”, diz. Agora, professor particular e também em uma escola, ele pensa em juntar dinheiro para projetos mais imediatos, como viagens. Para o futuro, pretende ter uma poupança que fará a longo prazo “e de forma caseira”, acrescenta. Especialista em RH, Pinho aconselha os jovens a optar, “com muito cuidado”, por uma previdência privada para complementar o orçamento no futuro. “O modelo americano de fundos de pensão poderia servir como bom exemplo para o Brasil. Lá os contribuintes têm um retorno justo do que aplicaram”, afirma.

Para quem não quer optar por uma empresa de previdência privada, Pinho sugere fazer a própria previdência “sem retiradas durante o processo”, destaca. Para Luis Ricardo Martins, presidente da Abrapp, entidade que reúne empresas de previdência privada, o jovem ainda não reflete sobre como será na velhice “e pensa pouco em fazer uma previdência complementar”. Segundo ele, o “jovem vai trabalhar mais, contribuir mais e terá um benefício menor”. Martins diz que para atrair os jovens, o setor vai incrementar a comunicação com o público e mostrar as vantagens do sistema da previdência privada. Com 2,5 milhões de contribuintes ativos, o setor está estagnado há cinco anos. “É preciso se reinventar para crescer”, afirma. 

(Filomena Sayão - Valor)

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