17/08/2016

Investimentos: O difícil caminho rumo ao risco

Estabilidade macroeconômica e a queda das taxas de juros sinaliza também novos desafios na gestão de investimentos dos fundos de pensão brasileiros

A possibilidade de um cenário futuro que traga estabilidade macroeconômica e a queda das taxas de juros sinaliza também novos desafios na gestão de investimentos dos fundos de pensão brasileiros a partir das estratégias que serão traçadas para 2017. Para debater os diversos temas relacionados às políticas de investimentos acontece hoje e amanhã (16 e 17), em São Paulo, o seminário O Desafio da Gestão de Investimentos dos Fundos de Pensão, promovido pela Abrapp. ”O debate ocorre no momento adequado, quando a possibilidade de estabilização econômica a partir de 2017 permite que os gestores comecem a pensar em diversificar suas estratégias; é a hora certa para iniciar uma reflexão sobre as políticas a serem implementadas no próximo ano”, observa o diretor executivo da Abrapp, Guilherme Velloso Leão. O encontro irá incorporar também questões ligadas ao aperfeiçoamento da governança e da gestão de risco nas Entidades Fechadas de Previdência Complementar, temas essenciais para a futura diversificação de ativos.

Diante da alta rentabilidade paga pelos títulos públicos federais e da volatilidade nos ativos reais, o apetite ao risco das fundações tem ficado em níveis mínimos históricos enquanto permanece a forte concentração em NTN-Bs. “Até maio passado, não haviam sido verificadas mudanças na alocação de recursos dos fundos de pensão, embora já tenha sido registrada uma clara melhoria nas expectativas dos gestores em relação à condução da política econômica brasileira em 2017”, informa a consultora de Investimentos da Willis Towers Watson, Francisca Brasileiro.

Ela explica que essa aparente contradição decorre do fato de que os gestores, em geral, são mais agressivos em suas análises do que acontece efetivamente nas carteiras sob sua gestão. Ou seja, embora as expectativas políticas e econômicas para o próximo ano tenham melhorado, na prática não havia sido registrada nenhuma mudança no perfil de alocação de recursos das carteiras até maio. A preocupação com a definição política e a segurança dos juros elevados mantiveram as carteiras fortemente concentradas nas NTN-Bs.

“Mesmo no cenário mais otimista, o grau de convicção dos gestores em relação a esse otimismo tem sido muito baixo, tanto nas carteiras com gestão própria quanto nos mandatos balanceados sob gestão terceirizada”, analisa a consultora. Isso por conta das muitas incertezas quanto à performance do governo federal interino frente aos fatores políticos que influenciam as necessárias reformas estruturais da economia e o controle dos gastos públicos. “Além disso, os mercados precisam conviver com uma realidade em que a gestão de investimentos é baseada não só em economia e política mas também em fatos policiais, o que reduz bastante a tomada de decisão baseada em previsões otimistas”, diz a consultora.

Melhora das expectativas

Apesar das incertezas e da ausência de realocações nas carteiras, houve uma nítida melhora das expectativas registradas entre o final de 2015 e maio de 2016, período em que a Willis Towers Watson atualizou sua pesquisa Perspectivas de Investimentos realizada junto a 38 assets que, juntas, somam R$ 1,7 trilhão sob gestão. Entre a 9ª e a 10ª edições do levantamento, “verifica-se que houve um alinhamento do mercado em relação à melhora das perspectivas e mesmo os mais pessimistas projetam o Ibovespa em 60 mil pontos , tudo isso como reflexo da nova equipe econômica do governo”, explica Francisca Brasileiro.

As projeções para juros, inflação e PIB feitas pelos gestores no final de 2015 apontavam aprofundamento da crise, deterioração da situação fiscal e aumento dos prêmios de risco, com a bolsa ficando no mesmo patamar do ano anterior e a Selic indicando novas altas até o nível de 15,25% ao ano no final de 2016. Eram perspectivas desanimadoras. A melhora detectada na revisão da pesquisa em maio mostra um forte impacto nas projeções do juro nominal.

A estimativa para a Selic no final do ano foi reduzida em 2% em relação às respostas de dezembro de 2015, chegando a 13,25%. Para 2017, também houve um arrefecimento com a projeção de 11,25% para o fechamento do ano frente aos 13,25% da pesquisa anterior. Os dados de projeção do PIB foram os únicos que apontaram uma piora nas expectativas de 2016. Os dados já preocupantes de crescimento negativo de 3% passaram a 3,8% negativos na revisão da pesquisa, refletindo uma deterioração que já vinha ocorrendo antes do processo de impeachment, resultado da baixíssima confiança dos agentes econômicos, da redução do investimento e do consumo. Já a projeção do PIB para 2017 reflete uma melhora, com a estimativa de um PIB positivo de 1%.

Juros reais

Para o investidor de longo prazo, conclui a pesquisa, a grande incógnita ainda é a estimativa de uma taxa de juros de longo prazo de equilíbrio.  As medianas das projeções referentes as taxas das NTN-Bs longas na 9ª edição da pesquisa estavam em patamares ainda elevados, apontando para 7,00% a.a. no final de 2016 e para 6,50% a.a. no final de 2017. As projeções indicadas na 10ª edição da pesquisa, já apontam para patamares bem menores, de 6,50% a.a. no final de 2016 e 5,00% no final de 2017. A projeção para 2017 indica um mudança em relação à média histórica dessa taxa nos últimos 10 anos, que poucas vezes ficou abaixo de 6,00% a.a. Vale ressaltar que as projeções mais pessimistas indicavam, um juro real de longo prazo de 8,23% na edição de dezembro de 2015, e de 6,00% na edição de maio de 2016.

Retomada do risco será gradual

À medida que a probabilidade de um cenário muito pessimista diminui para o próximo ano, acompanhando a queda na perspectiva de insolvência do País, as EFPC podem ganhar espaço para começar a retomar um pouco o seu apetite pelos investimentos de risco, avalia Francisca Brasileiro. As entidades devem continuar cautelosas em suas políticas de investimento, mas tudo indica que poderão subir um pouco a régua em relação ao risco diante da maior possibilidade de estabilidade econômica. “Não há espaço para pisar no acelerador no que diz respeito ao risco, conforme mostrou a pesquisa, até porque a volatilidade dos mercados ainda é altíssima”, avisa a consultora.

Ela lembra ainda que maioria das carteiras de renda fixa é composta por alocações estratégicas de longo prazo e isso não se muda de um dia para o outro, o que acaba inibindo a alocação em ativos com maior nível de risco
“O debate sobre gestão de investimentos deve estimular uma mudança no apetite a risco das fundações a partir do momento em que a economia estiver mais estável”,  pondera Guilherme Velloso Leão.

Aos poucos, renda variável, investimentos ligados a projetos de infraestrutura e ativos reais devem retomar seu lugar nas carteiras das entidades, ao mesmo tempo em que a melhor governança ajudará a refletir de forma mais criteriosa sobre esses investimentos, Será preciso que esse processo envolva todas as alçadas de governança das EFPC, lembra o dirigente: “Maior profissionalização para o sistema e melhor monitoramento de riscos serão cada vez mais importantes nesse novo ambiente de investimentos”.

(Martha E. Corazza - Diário dos Fundos de Pensão)

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