02/05/2016

Grandes fundos se mantêm conservadores

Diante do cenário político-econômico ainda incerto, a estratégia de investimento segue pelo terreno conservador.

Diante do cenário político-econômico ainda incerto, a estratégia de investimento definida pelos gestores dos maiores fundos de pensão do país segue pelo terreno conservador. Juntas, as fundações que cuidam das aposentadorias dos funcionários do Banco do Brasil (Previ), da Caixa Econômica Federal (Funcef), da Petrobras (Petros), da Vale (Valia) e de 15 empresas do setor elétrico paulista (Funcesp) detinham R$ 335,5 bilhões ao fim do ano passado, segundo a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). O valor corresponde a 46,5% do patrimônio de todo o setor, que congrega 307 entidades.

Com o desempenho seguidamente ruim dos ativos atrelados à economia real, os recursos dos planos de benefícios vão continuar saindo da renda variável em direção aos títulos públicos, em especial, às NTN-Bs, cuja rentabilidade é atrelada à inflação.

Mais do que tudo é uma opção pelo racional, alegam os gestores. Nos últimos dois anos, os juros ofertados nesses papéis se tornaram "muito convidativos" aos investidores institucionais. Além disso, vêm com a segurança de "casar" com a necessidade de desembolso de benefícios futuros e a meta atuarial.

"A renda fixa ficou imbatível", avalia Maurício Wanderley, diretor de investimentos do Valia. "A nossa estratégia é conservadora, mas o nível de juros é tão alto que o investimento em título indexado à inflação, racionalmente, é mesmo a melhor opção."

Tanto que os R$ 10,94 bilhões em ativos sob sua gestão no plano de Benefício Definido (BD) alcançaram o maior percentual histórico da alocação em renda fixa (81%) e o menor de todos os tempos em renda variável (1,5%).

Na avaliação de Marcelo Mello, vice-presidente da SulAmérica Investimentos, a deterioração do cenário macro fez com que o investidor pedisse mais prêmios para os ativos. Essa ´gordura´ gerou uma oportunidade para as fundações que estão tirando proveito ao longo dos últimos meses. Ele ressalta que a opção por papéis com taxa prefixada não isenta as fundações de risco, pois, se ao comprar um papel com taxa determinada e esta subir, o investidor perde no diferencial.

Segundo dados do Tesouro Nacional, em fevereiro passado, os fundos de pensão detinham 41% dos R$ 608,19 bilhões aplicados em títulos públicos federais pelo grupo Previdência. A amostra inclui também as entidades abertas e os regimes específicos de Estados e municípios (RPPS). O levantamento considera todos os papéis, e, não, apenas as notas indexadas à inflação.

Mello ressalta que o movimento menos agressivo também é de precaução. "Há o caso das entidades que registraram déficits atuariais e que não podem colocar mais risco na carteira sob perigo de abrir ainda mais o resultado negativo." Previ, Funcef e Petros, juntas, amargaram déficit em torno de R$ 40 bilhões no ano passado, segundo dados oficiais e estimativas de mercado.

Maurício Marcelini Pereira, diretor de investimentos da Funcef, afirma que continua a reduzir a posição em ativos atrelados ao desempenho econômico. "Desde 2012, o cenário reverteu de forma bastante abrupta, com baixo crescimento econômico, aceleração da inflação, as taxas de juros voltaram a subir e, com isso, voltamos nosso viés, ficando um pouco mais conservadores", diz. Ressalta que, só no ano passado, foram alocados quase R$ 3 bilhões em títulos públicos. As compras saíram entre 6,5% a 7% ao ano mais inflação.

A Previ já vem fazendo um plano de longo prazo visando o desinvestimento em bolsa. E isso, garante o diretor de investimento da fundação, Marcus Moreira de Almeida, independe dos ventos bons voltarem a soprar no mercado acionário. "A venda de ativos pode ser mais acelerada ou mais lenta de acordo com as condições de mercado, mas vai ocorrer". Atualmente, dos R$ 146 bilhões em ativos do plano BD, R$ 70 bilhões estão alocados em renda variável e R$ 60 bilhões na fixa, considerando também aplicações em papéis de empresas. "Esse é um plano maduro que, em 2015, teve R$ 9,6 bilhões em pagamentos e pode chegar a R$ 11 bilhões neste ano."

Jorge Simino, gestor dos planos da Funcesp, afirma que a existência de fatores que chamou de extra-econômicos deixa as decisões para alguma mudança no rumo das aplicações em compasso de espera. "Esse cenário [político] pode ter consequências financeiras importantes, mas com resultados ainda muito voláteis", afirmou, complementando que, se a evolução da bolsa for no sentido positivo de forma mais consistente é possível adaptar "alguma coisa".

Segundo ele, a cautela adotada no ano passado está sendo seguida pela entidade. Mas, ainda contrário à agressividade nas aplicações, a fundação apurou déficit de R$ 1,6 bilhão em 2015.

A espera é totalmente justificável na visão de Guilherme Benites, sócio da Aditus Consultoria Financeira. "Muito difícil um gestor querer operar em um cenário de impeachment", diz. Mas, ao mesmo tempo, lembra que, como investidores que visam o longo prazo, os fundos de pensão não precisariam esperar uma definição política, de curto prazo, para montar posição.

O conservadorismo não está apenas na cabeça do gestor. Os participantes têm se mostrado muito mais moderados em suas escolhas. Nos planos de Contribuição Variável (CV) do Valia, em que o perfil de investimento é opcional, a maior parte prefere uma alocação 80% em renda fixa e 20% em variável, diz Wanderley. "São fundos de gestão ativa com uma carteira que tem performado acima do Ibovespa nos últimos anos." Nos planos CV da Previ, conta Almeida, ocorre o mesmo, no caminho mais avesso ao risco.

A política de investimentos da Petros para o período de 2016 a 2020 prevê o recuo das aplicações em renda variável rumo à fixa com o objetivo de mitigar os impactos da crise econômica. Até dezembro de 2015, a parcela das aplicações em bolsa já haviam recuado de 37,47% para 30,54%, e, na fixa, aumentado de 44,77% para 50,97%.

Em nota, a fundação dos trabalhadores da Petrobras informou que mais de 90% dos investimentos realizados, com novos recursos e desinvestimento em renda variável, a partir de março de 2015, foram aplicados em renda fixa. Isso gerou rentabilidade anualizada de 13,60%. Foram comprados R$ 3,8 bilhões em títulos públicos.

Benites., da Aditus, sinaliza que o momento pode ser de um pouco mais de apetite pelo risco. Ele tem aconselhado a seus clientes de alta renda e fundações que, juntos, somam R$ 300 bilhões em ativos, no sentido da diversificação, voltando os olhos para ativos multimercados e nas boas ´pechinchas´ da bolsa. Já para as aplicações em dólar, o executivo é mais reticente por não ver espaço para ganhos.  

(Simone Cavalcanti - Valor Online)

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