20/11/2015

Fundos de pensão

Fundos de pensão freiam alocação fora

A internacionalização dos fundos de pensão brasileira foi freada ainda no ensaio. As carteiras que aplicam no exterior, cuja oferta multiplicou-se no ano passado, entregaram retornos fartos, que chegam a 50%, com um empurrão da valorização do dólar. O discurso de diversificação estrutural da carteira, entretanto, perdeu força neste fim de ano diante do crescimento dos prêmios das NTN-Bs, papéis atrelados à inflação, e do grande movimento de desvalorização e volatilidade do real. Fundos de pensão, que por regulamentação não podem superar os 10% em aplicações fora do país, abandonaram planos de diversificar no exterior ou até embolsaram os ganhos. 

"Quem entra com o dólar a R$ 2,35 e consegue sair a R$ 4 teve um ótimo resultado. Já realizei tudo", diz Letícia Ataíde, diretora de investimentos do fundo de pensão da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg). As aplicações no exterior, que tinham sido feitas no ano passado, foram trocadas por NTN-Bs. A justificativa é a necessidade de bater a meta atuarial, ganho mínimo perseguido pelos fundos de pensão. 

O entendimento de que as bolsas estrangeiras tinham alcançado as máximas históricas foi o que fez Dermeval Lima Filho, diretor financeiro da Fabasa, fundação dos funcionários da Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa), adiar o plano de investir fora. A política de investimentos autoriza a alocação de 5% no exterior, mas ainda não há nada aplicado. 

A Celos, fundo de pensão dos funcionários das Centrais Elétricas de Santa Catarina (Celesc), incluiu um limite de 1% aplicado fora na política de investimento em 2014, mas também voltou atrás. "Íamos entrar em um fundo global de renda variável com 0,5% do patrimônio em 2015, só que o ano começou, o juro aumentou, e não colocamos ainda", diz o gerente de investimentos, Marcos Cunha. 

Letícia, Lima Filho e Cunha participaram no fim de outubro com mais cinco diretores, analistas e consultores de fundos de pensão brasileiros de um evento organizado pela XP em Londres. Os convidados tiveram hospedagem, transporte e refeições pagas no programa que incluiu a provedora de índices MSCI, a gestora MFS e a plataforma de fundos Allfunds. 

A XP já tinha feito um evento semelhante com fundos de pensão em março em Nova York. Até agora, entretanto, o fundo de ações globais, uma seleção de 11 grandes casas - como Aberdeen, MFS, AB e BlackRock - não captou recursos. Está com R$ 17 milhões de "seed money", ou seja, dinheiro da própria casa. O recurso tem sido usado por casas globais para dar um empurrão às aplicações fora. Pela regulamentação, os fundos de pensão brasileiros não podem ter mais de 25% do patrimônio do fundo local que aplica na carteira no exterior. Sem o "seed money", um fundo de pensão teria que esperar outros três para alocar. 

"Acho que isso que estamos fazendo não é para agora", diz Patricia Stille, gestora do fundo de fundos da XP. Para ela, a gestora precisa construir um histórico de retorno na carteira que aplica fora para estar pronta a receber investidores quando a demanda ganhar força. "É um processo de educação que está começando agora", diz, ao considerar que o alto prêmio das NTN-Bs e o estresse do câmbio atrapalharam a captação. 

No caso da BB DTVM, pioneira ao lançar quatro fundos que investem em gestoras de fora em 2013 - da BlackRock, Franklin Templeton, Schroder e J.P. Morgan - a captação se concentrou em 2014. 

O fundo da BlackRock, cujo valor aplicado ultrapassou R$ 350 milhões em outubro do ano passado e chegou ao pico de 22 cotistas em janeiro, caiu a 19 investidores e R$ 218,54 milhões de valor aplicado um ano depois. Os retornos foram fartos - 16% em 2014 e 50% neste ano até o momento - o que impediu a queda de patrimônio. 

O valor aplicado no fundo do J.P. Morgan, que ultrapassou R$ 238 milhões em maio do ano passado, está agora mais perto de R$ 130 milhões. O da Schroder saiu do máximo de R$ 133 milhões para R$ 125 milhões aplicados. E o da Franklin Templeton em parceria com a administradora do Banco do Brasil, que chegou a ter três cotistas e R$ 24 milhões, foi encerrado. E não foi culpa de um desempenho ruim. Todas as três carteiras entregam mais de 30% neste ano. 

Os fundos lançados pela BB DTVM neste ano, em parceria com gestoras europeias, também não atraíram muitos cotistas - Nordea tem seis, UBS, quatro, Aberdeen, dois, e J. Safra Sarasin, nenhum. 

Houve um efeito da saída do "seed money", não mais necessário, em parte dos fundos, segundo Carlos André, diretor-executivo de gestão de fundos da BB DTVM. Ele assume, entretanto, que o câmbio tornou-se um ponto de alerta para os fundos de pensão. "É menos uma questão do patamar onde está e mais da volatilidade dos últimos dois a três meses, que causou um pouco mais de incerteza." O BB, segundo ele, está preparado para considerar a possibilidade de fazer hedge das carteiras, ou seja, eliminar a exposição cambial, caso haja uma demanda dos cotistas. 

"O objetivo de diminuir risco-Brasil continua, agora o que o mercado está fazendo é avaliar mais cautelosamente. Houve uma pausa", diz Francisca Brasileiro, consultora sênior de investimentos da Towers Watson. 

O investimento fora deveria ser visto como uma diversificação da carteira de ações, não como um concorrente das NTN-Bs, defende Ruth Walter, sócia da F3, que tem R$ 2 bilhões de fundos de pensão sob aconselhamento. Cerca de 30% do valor alocado por eles em renda variável, defende, deveria estar no exterior. 

"Entendo que dá vontade de resgatar, mas eles deveriam esperar passar", diz Arthur Mizne, responsável pela área de investimentos globais da M Square. Para defender a tese, a gestora, que oferece uma carteira recheada de fundos globais a fundos de pensão há dez anos, fez um estudo. E mostrou que um portfólio com 70% do patrimônio em NTN-Bs com vencimento em 2045, 10% atrelados ao CDI e 20% em Ibovespa rendeu 12,9%, com volatilidade de 10,9% na última década, enquanto a carteira que atrelou metade da renda variável ao MSCI World obteve ganho maior, de 13,2%, com volatilidade menor, 9,7%. 

"Quem está tentando adivinhar se está na hora de entrar ou sair está especulando com os dois ativos mais difíceis: bolsa e câmbio", diz Everaldo França, sócio-diretor da PPS, que presta consultoria a 50 fundos de pensão. Eles deveriam ter sempre uma parte da alocação fora, defende, ainda que no momento sem exposição ao dólar. (Luciana Seabra - Valor Online).

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