03/09/2021

Crédito sem educação financeira é mais problema que solução

Novo recorde aponta que 73% das famílias brasileiras estão endividadas e o maior vilão é o mal uso do crédito. Segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) divulgada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o mês de agosto bateu novo recorde no percentual de endividamento. Atualmente, 72,9% das famílias brasileiras estão endividadas e é preciso entender o que isso representa.

Primeiramente, endividado é diferente de inadimplente, pois enquanto o primeiro possui dívidas a pagar e consegue quitá-las dentro dos prazos de vencimento, o segundo já perdeu a capacidade de pagamento e está (ou em breve estará) com o CPF negativado nos órgãos de proteção ao crédito. Os números da inadimplência também são alarmantes: um em cada quatro brasileiros (25,6%) não consegue pagar as contas em dia.

Entre os endividados, 21,1% estão com mais da metade da renda comprometida com o pagamento dessas dívidas. Significa dizer que uma a cada cinco famílias terá de viver pelos próximos meses (ou anos) com menos da metade do dinheiro que entra mensalmente. Dentro desse quadro, se algum familiar perde o emprego ou tem sua renda diminuída, as chances de parte dessa família (ou toda ela) entrar na inadimplência aumentam consideravelmente.

O crédito em si não é algo ruim, pois facilita o consumo e possibilita um planejamento financeiro tanto para a aquisição de bens quanto para apoiar o empreendedorismo. Porém, crédito sem educação financeira representa muito mais problema do que solução. Diante dessas estatísticas, fica claro que o brasileiro se acostumou a viver de crédito – e não apenas a recorrer a ele eventualmente –, mas sem conhecimento financeiro, tem optado principalmente pelas modalidades com as taxas de juros mais altas: cartão de crédito e limite de conta corrente.

O cartão tem sido utilizado para comprar o que o salário não alcança e, sem condições de quitar o total da fatura, é comum que as pessoas entrem no rotativo (que é quando se paga qualquer valor entre o mínimo e o total), sem fazerem as contas dos juros que serão cobrados nos próximos meses e, para piorar ainda mais, continuam fazendo mais e mais gastos. Basta um mês de descontrole para gerar a tão famosa bola de neve que compromete – e muito – o orçamento familiar. Já o limite da conta funciona, para muitos, como uma extensão da renda, dando início a um ciclo igualmente difícil de sair: a pessoa usa o limite, o salário cai e cobre primeiro os juros bancários e, com o que sobra, abate o saldo negativo. Sem dinheiro para pagar as contas, a pessoa usa o limite novamente e recomeça o ciclo aumentando a dívida cada vez mais.

Quando uma pessoa assume uma dívida, significa que ela está “vendendo” parte do seu futuro para o pagamento de uma despesa feita no passado. Isso, porém, não a isenta das obrigações do presente, as quais ela terá de honrar com uma renda menor do que antes. Logo, se o dinheiro não tem sido suficiente para os gastos do dia a dia, assumindo empréstimos a juros altos, essa renda ficará ainda menor e, com a inflação em alta, o dinheiro comprará cada vez menos, enquanto a dívida cresce cada vez mais.

Quem se beneficia com a falta de conhecimento da maioria dos brasileiros são os credores que, legalmente, trabalham com taxas de juros que se assemelham às cobradas pelos agiotas.  Conceder cada vez mais crédito não é a solução, pois isso só fará com que mais recordes sejam batidos no futuro, como temos visto dos últimos anos para cá. Educação financeira é fundamental para uma mudança positiva e duradoura.

(Patricia Lages - Portal R7)

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