17/05/2017

Reforma antirrepublicana

Vá lá que a política é a arte da negociação.

Vá lá que a política é a arte da negociação. Vá lá que consensos se constroem sobre concessões. Mas o governo Temer flexibilizou tanto a reforma da Previdência que acabou por sacrificar o argumento moral que um dia a amparou.

O maior mérito do projeto original, apresentado no fim de 2016, era que ele punha fim a privilégios difíceis de justificar. A proposta inicial eliminava as diferenças entre servidores públicos e trabalhadores da iniciativa privada e igualava a idade mínima de homens e mulheres. Apenas os militares haviam, injustificadamente, penso, ficado de fora.

Mas eis que vieram as negociações, e os grupos de pressão mais poderosos conseguiram emplacar suas reivindicações. Servidores estaduais e municipais foram excluídos da reforma. Uma série de categorias politicamente relevantes, como policiais e professores, deu um jeito de reduzir a sua idade mínima. Mulheres também conseguiram manter uma desigualdade que as beneficia. Não tenho dúvida de que outros setores ainda serão capazes de manobrar para estender seus privilégios.

Uma defesa da reforma com base em argumentos de igualdade republicana ficou mais difícil, para não dizer impossível. É claro que ainda dá para sustentar a necessidade de proceder às mudanças por razões pragmáticas. Sem reforma e com o teto de gastos já aprovado, o aumento vegetativo dos compromissos previdenciários começará a pressionar outras despesas essenciais do governo já a partir de 2020. E, se tirarmos o teto, as dúvidas sobre a trajetória da dívida pública retornam com força, trazendo de volta a desconfiança que foi decisiva para produzir a recessão em que nos encontramos.

Obviamente, não dá para abrir mão da política e da negociação. Mas é lamentável que, mais uma vez, tenhamos nos mostrado incapazes de articular uma reforma impopular mas necessária em torno de ideais republicanos de igualdade.

(Helio Schwartsman - Folhapress)

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